Cine Café – Woody Allen, Meia Noite em Paris e o amor pela cultura

julho 12, 2011



Antes de qualquer coisa, acredito ser um desafio imenso falar de Woody Allen. Desafio, porque ele é um gênio! E tenho humildade de reconhecer que falar dele, nem que seja uma linha, não é para qualquer um e exige pesquisa....ôh, e como exige! Como qualquer artista internacionalmente conhecido, Allen possui fãs xiitas espelhados pelo mundo, sempre aptos a defendê-lo ou a enaltecer ainda mais o seu legado, como bem lembrou Rubens Ewald Filho, em artigo publicado em seu blog no @portalR7.


Woody Allen é a síntese de um produtor cultural, cinematográfico e teatral intenso, que bebe de várias fontes artísticas. Sem contar que o trabalho dele é único e muito, mas muito autoral. É só conversar com alguém que entende um pouco mais de cinema que a resposta é unânime: Woody Allen se mantém fiel ao seu estilo e tem um repertório cultural de tirar o chapéu! Admiro isso. Não assisti todos os filmes dele, mas tenho alguns que me marcaram muito, tais como "A Rosa Púrpura do Cairo" (1985); "A Era do Rádio" (1987) e, mais recentemente, "Meia Noite em Paris" (2011).

Quando voltei de São Paulo, reencontrei alguns amigos que me questionaram sobre o que achei de "Meia Noite em Paris". Eles leram o post sobre as minhas Férias em São Paulo, e me perguntaram se achei o filme bom, ruim e se valia a pena ir ao cinema ou baixar na internet. “É excelente!”, respondi. Quanto baixar ou ir ao cinema, isso vai do gosto do freguês. Cada um tem livre arbítrio para fazer o que quiser, não é mesmo?

Pois bem...papo vai, papo vem, um amigo me confidenciou em off que levou a namorada para assistir o filme e ela detestou. Pasmo, fiquei pensando o que deveria ter acontecido para ela não gostar do filme. Para minha surpresa, foi o fato dela achar a narrativa cansada e cheia de referências artísticas que ela não conhecia. “Bom, eu também não conhecia tudo e não achei a narrativa cansada. Mas o filme me fez pesquisar na internet. Não que conhecer os artistas seja fundamental, mas ajuda a entender o real motivo deles serem citados com tanta veemência”, ponderei.

Esse mesmo amigo também disse que pesquisou e começou a admirar o trabalho de Ernest Hemingway. Daí, ele soltou: “Fiquei chateado com a minha namorada! Meia Noite em Paris tem uma mensagem tão bacana sobre sonhos, sobre valorizarmos mais o presente, e ela dormiu o filme inteiro”, disse ele. Um outro amigo, por volta dos 18 anos, me falou algo sobre o filme que me deixou realmente perplexo: “Meia Noite em Paris é um filme de velho! Tenho preguiça...só quem é velho entende”. Meu Deus, será mesmo? Nem sou tão velho assim...rs.

Infelizmente, já venho constatando uma coisa que não é diretamente ligado ao “Meia Noite em Paris”, mas aos filmes, documentários [de maneira geral] e, sobretudo, à séries e programas de TV: boa parte do público não gosta de hiperlink, de ter que pesquisar aquilo que não sabe e somar um dado com o outro. Gostam de ter tudo mastigado. Isso não é bom! Mas é o reflexo da nossa educação. Fiquei com isso na cabeça.

Claro, nem Jesus Cristo agradou todo mundo. Quiçá, Woody Allen. Eu mesmo, quando acabei de assistir o filme, fiquei pensando: fazer a crítica de "Meia Noite em Paris" é uma tarefa bastante complicada, pois o filme é cheio de referências. Posso dar um tiro no pé e falar alguma bobagem. No dia em que assisti, comentei com a amiga @leticiacastro que ela poderia fazer uma crítica excelente, pois ela estava por dentro de todas as referências. Iria ser um material único! Só de conversar com ela, aprendi muita coisa que não sabia. Depois, pesquisei no Google por conta própria: ninguém sabe de tudo, uai!

Allen foi tão sagaz que qualquer um que ouse falar de "Meia Noite em Paris" precisa ter uma sensibilidade histórica e cultural para entender o clamor de Gil Pender (Owen Wilson) – um roteirista de Hollywood frustrado com o sucesso dos seus "filmes vazios", que acredita que Paris seria o reduto perfeito para ele recomeçar a carreira de escritor, tendo como norte a efervescência artística da Cidade Luz da década de 1920. A noiva fútil de Gil e os futuros sogros dele não botam muita fé no sonho dele e desdenham do roteirista o tempo todo. Num dado momento, Gil percebe que o maior duelo dele não é com o mundo, mas sim consigo mesmo.

Após uma rachadura entre realidade, sonho e muitas doses de álcool, Gil caminha bêbado por Paris e se perde ouvindo 12 baladas no relógio. Quando vê, está dentro de um carro peugeot antigo, indo parar numa festa para o cineasta francês Jean Cocteau, ouvindo Cole Porter tocar piano e numa roda de conversa com Scott e Zelda Fitzgerald, Ernest Hemingway, T.S. Eliot e outros nomes que ajudaram a construir a história da arte contemporânea. Nesse meio tempo, Gil se apaixona pela sensual Adriana (Marion Cotillard), amante de Picasso, ex de Modigliani e Braque. Nesse momento, ele faz uma escolha que muda para sempre o rumo da sua própria vida. Veja o trailer de "Meia Noite em Paris":





Ao ler o excelente artigo de @ccalligaris, na @folha_com, dessa quinta-feira (07/07), sob o título “É fácil desistir dos nossos sonhos”, fiquei pensando o quanto "Meia Noite em Paris" é importante para a nossa geração: é um filme provocador, em todos os sentidos. Por isso que resolvi escrever este post aqui no @cafecnoticias. Nunca fui saudosista como Gil, mas acredito na importância de realizarmos nossos sonhos. “Viajei na maionese” com a linda abertura de Woody Allen, mostrando a beleza [fotográfica] de Paris, logo no início do filme. É como se o espectador fizesse um city tour pela capital francesa e celebrasse o monumento artístico à céu aberto que é esta cidade. O filme me ganhou só por essas tomadas, confesso.

Infelizmente, vivemos numa época em que parecer é melhor do que ser – e isso causa muitas frustrações pelo mundo a fora. Entretanto, não trocaria nada disso pelas possibilidades culturais, midiáticas e informativas da nossa época atual. Não consigo me ver sem internet, por exemplo. E o filme de Allen mostra uma Paris latente, viva, apaixonante, que oscila entra a boêmia e intelectualidade....além disso, nos dá uma lição linda no final, falando o quanto é importante conhecermos o passado para fazermos um presente ainda melhor. O futuro é agora! E isso é um exercício que devemos praticar.




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Wander Veroni
Jornalista

MAIS CAFÉ, POR FAVOR!

6 comentários

  1. Wander querido, muito lindo isso que você escreveu....o seu texto é mais que uma resenha do filme, mas um chamado importante para que não percamos o amor pelo aprendizado, pela cultura. É por isso que sou fã do seu blog. Beijos

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  2. Gosto do trabalho do Woody Allen....ainda não assisti Meia Noite em Paris, mas depois do que vc escreveu fiquei com vontade de assistir. Parabéns pelo blog.

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  3. Ficou muito boa a sua resenha, compadre. Viu como vc também conseguiu? Não sei se vou fazer a minha ainda. Não sou temporal, se me dá na veneta, faço. Fiquei mais blogueira que jornalista, fazer o que? Você me animou, no entanto. ;)

    Mas, discordo que Gil era saudosista. Ele encontrou, em sua viagem ao tempo, as respostas que precisava no presente e seus ídolos do passado só estavam ali representando o papel que sempre tiveram na vida dele.

    Também discordo, de modo combativo, sobre não ter que conhecer todos os ícones que ajudaram a ilustrar o filme. Como assim? E o amor à cultura que vc mesmo defendeu tão veementemente? É preciso sim buscar por ela, quanto mais se descubra, melhor.

    A gente precisa buscar diariamente por esse conteúdo, compreendê-lo e armazená-lo.

    Eu demorei 38 anos para entender todos que passeiam pela obra de Allen e isso aconteceu das formas mais inusitadas. Por exemplo, entendi Gaughin pelas mãos de um francês que me relatou que, ao ver suas taitianas, como homem, não podia evitar não ficar excitado. Estávamos em um trem, de Paris à Riviera, e aprendi que Gaughin era sensual.

    Então, quanto mais tempo percamos em ir atrás das belezas do mundo (e a beleza só é descoberta através do saber), mais ficamos reféns do lixo que nos metem goela abaixo todos os dias. Não estou falando apenas da erudição clássica, blá blá blá, mas meu Deus do céu! Vá à feirinha de artesanato da esquina, pergunte aos artistas sua origem, que tipo de arte é essa, de onde veio, o que significa... Isso é encher-se de cultura. E depois, passe na biblioteca da sua cidade e leia a Ilíada de Homero, por exemplo. Vc vai descobrir que é uma história que fala de gente do mesmo jeito.

    Desculpem, senhores, mas não dá para pedir para quem já teve os sentidos abertos por Cole Porter que aprecie Luan Santana. É fato, não é arrogância, entendam como quiser.

    Uma vez um jornalista de uma publicação famosa (vc sabe de quem estou falando) me chamou de preconceituosa ao dizer no Twitter que ia trocar de canal porque estava uma certa dupla sertaneja na TV. Entenda-se: nada tenho contra o sertanejo, mas breganejo terá a minha aversão até o último dos meus dias. Disse a ele que não podia fazer nada porque era psicossomático: eu realmente sentia dor de estômago ao escutar aquela gemeção poluída. E sinto! E é verdade, e se continuo ouvindo, vomito! O que é que eu posso fazer? Agora, coloca "Chico Mineiro" (com Pena Branca e Xavantinho, por favor) pra ver se eu não choro? Convenhamos, né?

    Enfim, compadre, a você eu desejo que a cada dia faça novas descobertas e continue seguindo por esse caminho mesmo que o fez procurar em outras fontes (além do nosso papo) e aprender todas as referências que culminaram nesse post.

    Não desista nunca disso. É a única coisa que não vão levar de você.

    Bjs!

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  4. E só uma errata: a grafia correta do grande mestre é Gauguin. Sempre me confunde.

    Mais beijos!

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  5. Olá Wander!!

    Antes de mais nada, quero apenas advertir que quando o assunto é cinema, eu sou completamente leigo rsrsrs Pra vc ter uma ideia, até pouco tempo mal sabia quem era Wooddy Allen.

    Ontem fui assistir o filme com um amigo. Ele detestou, achou parado demais, achou sem nexo.

    Eu particulamente achei a narrativa lenta, mas, o delírio que ele tem pelo menos a mim deixou curioso (talvez porque eu sinta quase que o mesmo saudosismo que ele, mas com os anos 70/80). Fora que a Adriana é simplesmente INCRIVEL! Aquele olhar sedutor dela está na minha mente até agora rsrsrs Realmente, quem gosta das coisas mais mastigadas, ou prefere filmes mais agitados e/ou não curte muito literatura, acredito que realmente vai detestar.

    Mas, mesmo não tendo curtido muito a narrativa, o filme me provocou. É provavel até que eu escreva um post sobre isso. É im filme que veio num tempo certo, onde as pessoas estão cada vez mais se esquecendo do seu presente e sempre achando que o passado é melhor.

    Quanto aos comentários que você ficou impressionado, infelizmente, a maioria das pessoas já está habituada ao estilo padrão dos filmes hollywoodianos, tanto que quando vêem um filme diferente, a reação vai do estranhamento ou da repulsa.

    Parabéns pela sua analise e pela linda foto escolhida para representar o Woody Allen.

    Abçs!!

    Danilo Moreira

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  6. En definitiva una de las mejores películas del 2011. Me gusto bastante, sobre todo el final de la historia.

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